domingo, 24 de junho de 2012

O problema da companhia

Pouco se sabe sobre essa história: Menino branco, olhos e cabelos (longos) castanhos, não era muito alto, magricela e bem afeiçoado. Um dia, foi para fora da casinha onde morava (numa fazenda, num interior qualquer de Minas Gerais), olhou para o céu e pensou: "tempo bom para nadar". Pegou uma camisa seca, vestiu. Um beijinho na mãe, acenou para o pai e foi-se embora. Não muito longe de lá estava a cachoeira escolhida pro mergulho. Vendo que o sol se escondia cada vez menos, decidiu correr um pouquinho. Chegando perto, foi despindo-se apressadamente, se jogou de corpo aberto na água. Brincou até onde não dava mais, foi até onde não dava pé, se refrescou e decidiu parar um pouco na borda, para apreciar a vista. Debruçou-se sobre o cascalho e as pedras, bem na beira, olhou a água com pouco movimento, em contraste com a violência da que batia bem abaixo do centro da cachoeira. Viu seu reflexo na água, feições que vira naquele mesmo dia pela manhã. Mal percebeu-se. Vindo não sei de onde, a água aumentou sua intensidade, quando somada a queda, formou quase uma onda em direção ao garoto. Quando a onda passou, o reflexo do garoto na água mudou. Viu um rapaz, olhos e cabelos (ainda longos) castanhos, blusa pólo e indecisão no olhar. De tanta surpresa, nem se moveu, continuou observando a cara nova que aparecia na água. A cachoeira pressionou de novo, outra onda parecia se formar. Olhou para o reflexo, viu um moço, cabelo curto recém cortado, terno, gravata e tristeza no olhar. Esse último reflexo abriu a boca levemente para falar alguma coisa, mas não deu tempo, outra onda veio. Dessa vez um senhor de idade, dos reflexos o mais triste, miserável. Não dava para distinguir muita coisa, mal se via a roupa que vestia, mas esse conseguiu entregar o recado, sussurrando baixinho com dificuldade para falar: "Quer mesmo refletir um só?".

T.Rodrigues



Nenhum comentário:

Postar um comentário