terça-feira, 28 de agosto de 2012

Destino é conto da carochinha

Da moça eu pouco sabia, o que tenho em mente me foi contado, quiçá observado. Filha única, um metro e pouco, peso médio para uma altura mediana, beleza dessas de cinema. A maioria das histórias que conto é assim. O que faz o caso dela ser atípico era que tudo para ela não passava de coincidência. Ela usava padrões. Não acreditava em nada. Tudo se encaixava matematicamente. Até o dia que conheceu Arthur.

Ela narrou à situação dessa maneira: quando saiu do trabalho, quis pegar um caminho diferente para casa. Passando pela Rua dois, um congestionamento (nunca antes visto na região) fez com que ela parasse o carro, fechando um cruzamento. Algo lhe incomodou de longe, abriu a porta para ver o que era: uma criança sozinha na rua. Aproximou-se e percebeu que a mãe estava por perto. Virou-se para seu carro no tempo exato de presenciar outro veículo chocar-se com o seu. Respirou fundo. “Essas coisas acontecem.” Um homem saiu de dentro do carro e veio desculpar-se pelo acidente. O cabelo dele era do tipo que ela achava mais atraente. Os olhos eram claros, do jeito que ela amava. Era da altura que ela gostava em um homem. Ele por sua vez, educadíssimo, fez uma boa primeira impressão, apesar da situação inesperada. “Meu nome é Arthur, sinto muito pelo carro...” e esse era o nome que ela pretendia dar para seu primeiro filho, caso um dia tivesse um. Até agora, para ela, nada disso era destino. Não passava de fatos matemáticos, equações e escolhas que a levaram aquele lugar.

Então percebeu que do carro de Arthur vinha uma música.

- O que você está ouvindo?

- Frank Sinatra.

Pronto. Agora ela acreditava.

T. Rodrigues


segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A mais doce da cidade

Conheci uma mulher na rua da feira, entre flores e verduras. Andava despreocupado, quando vi seu rosto na sacada a observar o movimento. Eu estava lá embaixo, ela lá em cima.

A minha frente o feirante anunciava "a melancia mais doce da cidade". Curioso, cheguei perto, e o vendedor me ofereceu um pedaço para experimentar. Olhei para o alto, ela ainda estava lá. Peguei a melancia, comi um pedaço e constatei: realmente era a mais doce que já havia comido. Enquanto apreciava o gosto, me veio algo à cabeça: será que doces também são os lábios dessa mulher na sacada da feira ? Ahhh, como queria prová-los...

Ouvi um barulho ensurdecedor que me trouxe de volta a realidade. Com uma buzina, o homem do Biju gritou, praticamente dentro do meu ouvido: “olha o Biju! Olha o Bijuuu!”, apertando a buzina e chamando a atenção de todos. Ela a que tudo observava, olhou para mim e sorriu, talvez o meu susto houvesse despertado o seu sorriso, não sei. A verdade é que a moça na sacada tornou minha ida à feira o evento mais esperado da semana.

Foto: Limoncino

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Cartão postal

Quando vejo aquele cartão postal, aquele sério, meus olhos mentem. O sorriso fora daquele rosto simplesmente não combina, é falsa representação da verdadeira personalidade. Seriedade parece não encaixar quando felicidade é o que a define. Incompatível como quando a gente encaixa as pilhas do controle remoto às avessas. Inverossímil como quando a gente troca a ordem das cordas do violão. Inadmissível como colocar sal no café com leite e esperar que seja doce. Não é justo, não a representa. Portanto, colocarei açúcar no café, inverterei as cordas do violão e encaixarei as pilhas na ordem correta, se ela sorrir no próximo cartão postal.

T.Rodrigues



quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Sobre gentileza e romantismo

Saúdo os antiquados! Aqueles que ao conhecer, dizem "encantado em conhecê-la"; ao agradecer, dizem "não há de quê"; ao se referirem às mulheres, usam "senhorita", meu respeito! Que conservam o "primeiro as damas", que pedem a devida licença ao entrar e sair, que se mantem elegantes mediante ao desespero, os aclamo! Louvores à aqueles que fazem a gentiliza, aqueles que a praticam, que não tem medo de serem chamados de antigos ou  conservadores. Que presenteiam com rosas, que se atem às serenatas, que enviam cartas de papel e planejam seus jantares, minha admiração eterna! Pois os gentis poderão deixar de ser românticos, mas os românticos sempre serão gentis. Rumo à extinção caminharemos, rumo à raridade...

T.Rodrigues