domingo, 30 de setembro de 2012

Inverno de primavera

Se das tuas viagens pelo mundo retornar, bem meu, por favor não voltes para casa. A cama já não lembra teu perfume, teu lugar na mesa não existe mais. Se nos teus erros de menina quiser arrepender-se, bem meu, por favor, se contentes para lá. Já não ouço mais nossa música, teus sentidos já não são meus. Se um dia quiseres ter comigo, bem meu, por favor não venha. De suas mentiras já não me lembro, de suas verdades nunca ouvi falar. E se um dia a saudade bater, bem meu, negue-a. Não deixe que entre pela porta do coração. Pois aquelas flores de ipê da primavera passada há muito secaram, o samba nosso morreu, o gato fugiu e eu me perdi. Me perdi na poeira de um coração partido. Na miséria de um amor maltratado. No relato não dado, do cara do outro lado.

T.Rodrigues


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Internet e seus (mal-ben)efícios.

"Me manda seu telefone pelo facebook depois", "coloquei o convite no twitter lá ok?", "qualquer dúvida, me pergunta no ask"... as interações não são as mesmas de (incrível) uma década e meia atrás. Guardo com tanto carinho as memórias dos -quase- velhos tempos. Não tínhamos muitos recursos, se você quisesse flertar com aquela garota bonita do colégio, você tinha que falar com ela. Falar mesmo. Nada de mandar uma mensagem no facebook, curtir uma foto ou participar de um chat ou bate-papo qualquer. A segunda opção era esperar pelo correio elegante. A melhor data do ano para falar algo que você não tinha coragem de falar no tête-à-tête.

Eu amava isso tudo. O fato de poder escrever cartas, para mim, era especial. Fico infeliz de dizer a palavra, mas fico sem opção: 'antigamente', era romântico escrever uma bela carta com perfume -mas sem exageros- e mandar para a garota desejada. Era sempre bem vinda uma carta de amor, ao menos era o que parecia. Lembranças palpáveis, daquelas que podemos guardar em caixinhas onde colocamos só as coisas mais especiais que vivemos. É engraçado pensar: nossas memórias mais especiais na atualidade se encontram em caixinhas que precisam de baterias pra funcionar.

Tenho medo do efeito da internet nessa nova geração. As pessoas estão tão acostumadas com a facilidade que esse recurso oferece, que tem esquecido aos poucos os contatos básicos (mas necessários) que unem as pessoas. Uma frase clichê que se aplica a meu raciocínio seria: "a internet veio para aproximar que está longe e afastar quem está perto.". 

Como serão os Romeus e Julietas dessa geração? será que o Romeu, ficaria esperando na sacada, e mandaria uma inbox no facebook para a Julieta aparecer na janela? será que a Chapeuzinho Vermelho faria um check-in no foursquare quando entrasse na floresta? ou João e Maria, com o auxílio de um gps, não se perderiam?

Fico imaginando o custo benefício disso tudo. Será que a internet nos deu mais do que nos tomou? O medo da resposta começa quando essa pergunta acaba de ser feita na minha mente.

T.Rodrigues

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Provável história real

Na cama, de olhos fechados, percebo minhas pálpebras ficando vermelhas levemente e a sensação de calor aumenta. É o sol que veio me dar bom dia, pela janela entreaberta. Levanto e penso em todas aquelas coisas que deixei pra fazer nessa quarta feira de outono. Aquela dieta que eu não comecei na segunda, a torneira do banheiro que continua pingando, a ração que não coloquei pro gato ontem. Vou fazer tudo hoje, sem falta. Mas preciso ir trabalhar.

O caminho foi mais tranquilo que ontem, o trânsito parece estar melhor. Me pego olhando pela janela do carro, e de repente tudo parece fazer parte de uma construção divina, algo maior. Esses quarteirões quadrados em formato de bolo da minha falecida vovó. Esses sinais mudando suas cores, me lembram o natal que está por vir. Até o velho da praça, pedindo esmola, me faz sentir renovado. Me compadeço dele. Uma moeda hoje, é o que eu tenho, espero que ele mate sua fome. Continuo meu caminho.

Tenho muito trabalho pra fazer, dou um "bom dia" tímido para a secretária e sigo para o escritório. A minha sorte é que ainda tenho até sexta pra entregar. Ando cansado, Deus sabe o quanto. Minha família, as vezes me sinto distante dela. Eu realmente preciso mudar isso, vou parar com essas promessas. Quando chegar em casa, vou alugar um filme para ver com eles.  Espero que eles gostem. Apesar dos problemas, me sinto grato por ter mais um dia. E se o dia for ruim, minha cama me espera em casa. Minha esposa me espera nela. Meus filhos.

Amanhã, eu começo a dieta. 

(anônimo, World Trade Center, 11-09-2001)

T. Rodrigues